Um cliente que vale por muitos
Avaliador que se comporta como consumidor comum, cliente oculto ajuda empresas a identificar e corrigir falhas de atendimento
O funcionário rabugento que maltrata as pessoas, o ar-condicionado da loja que congela os clientes, a longa espera por atendimento sem nenhuma informação. Aparentemente simples e fáceis de serem corrigidas, situações como estas podem representar a diferença entre um negócio bem-sucedido e outro que perde clientes e receita em ritmo acelerado. Afinal, quem não deixou de fazer compras em uma loja ou de freqüentar um restaurante após ter sido mal-atendido?
Pequenas e médias empresas – que têm donos e sócios à frente do dia-a-dia do negócio – conseguem, em geral, identificar e corrigir rapidamente falhas desse tipo, que exigem uma visão atenta e cuidadosa. Os problemas começam quando o empreendedor precisa, por alguma razão, se afastar da linha de frente e perde o contato direto e freqüente com os clientes. Uma alternativa para que a avaliação da empresa não dependa apenas da boa vontade dos funcionários ou da opinião de amigos é investir na contratação do serviço de cliente oculto (ou cliente misterioso).
Convocados por empresas especializadas no segmento de consultoria conhecido como “mystery shopping”, o avaliador vai até o estabelecimento comercial e age como um consumidor comum, embora tenha a missão de avaliar itens como educação e treinamento de atendentes, qualidade dos serviços prestados e até mesmo o ambiente. Após as visitas, os resultados, frequentemente, surpreendem os empresários.
Vice-presidente da operadora de turismo jovem STB, que tem 66 lojas, Santuza Bicalho conta que após a crise de 2008 sentiu a necessidade de medir o clima e avaliar o atendimento nos escritórios da rede. Para isso contratou uma empresa especializada em pesquisas com clientes misteriosos. Os avaliadores visitaram várias lojas, incluindo as dos principais concorrentes, em diferentes horários e períodos, como na alta e na baixa temporada da venda de pacotes.
“Os primeiros resultados foram frustrantes. Identificamos falhas no atendimento das lojas e lentidão nas respostas aos clientes que nos procuravam pelos sites, entre outros pontos negativos levantados”, diz. Entre as descobertas, Santuza cita ainda fatos inusitados. “Descobrimos que os clientes achavam que uma de nossas principais lojas estava sempre fechada, pois o letreiro luminoso da porta nunca estava aceso. A solução foi simples, já que bastou substituir o timer que controlava a placa. Chegamos a achar graça ao ver que algo tão bobo prejudicava nossa imagem”, afirma.
Presidente da empresa Shopper Experience, que tem mais de 20 anos de experiência em pesquisas com clientes ocultos, Stella Susskind garante que, na maioria das vezes, a perda de clientes ou a redução da receita não se atribui à concorrência, mas a falhas que acontecem dentro da própria empresa. Ela lembra do caso de uma loja de roupas em que a dona não apenas via suas vendas caírem como também percebia que era cada vez menor o número de clientes que entravam no provador para experimentar as peças à venda. Após algumas visitas de clientes ocultos, descobriu-se que o provador era um espaço completamente desconfortável para as mulheres que provavam as roupas.
“Além de as cortinas não se fecharem completamente, criando um ambiente de provador coletivo, o ar-condicionado era glacial. Para piorar, as vendedoras entravam o tempo inteiro no espaço trazendo itens que sequer tinham sido pedidos, tirando a privacidade das clientes”, diz. Após uma reforma e um treinamento da equipe de vendas, afirma, a situação foi contornada e a loja conseguiu reverter a perda de receita.
Rodada de visitas custa cerca de R$ 6 mil
Não existe um preço único para a contratação da pesquisa com clientes ocultos, já que o trabalho é customizado para atender as necessidades de cada empresa. Mas, as consultorias especializadas em “mystery shopping” estimam que uma rodada de visitas com três a seis avaliações diferentes, incluindo a entrega de relatórios, fique em torno de R$ 6 mil.
Diretor da Qualylife, Daniel Sanches diz que o ideal, ao contratar essa ferramenta de pesquisas, é elaborar um plano que contemple visitas nos horários de pico e avalie todas as equipes em seus diferentes turnos. “A partir de uma rápida análise do empreendimento, é possível definir os horários de maior movimento que permitem avaliar com precisão se atendentes ou vendedores estão preparados para atender os clientes”, diz.
Outra recomendação é que os funcionários não sejam avisados sobre a contratação do serviço ao menos durante a primeira rodada de visitas do cliente oculto. “Ao saberem que serão avaliadas, as equipes podem mudar de postura, desvirtuando os resultados”, afirma Sanches.